Introdução ao número 1/3 do v. 27 da revista Cadernos de C&T
Resumo
Este é o 27º volume dos Cadernos de Ciência & Tecnologia, correspondente ao ano de 2010 e publicado posteriormente. O volume 27 foi editado em um único fascículo e traz cinco trabalhos advindos de diversas áreas acadêmicas, além de duas resenhas. Quatro desses trabalhos se concentram em produtos – feijão, milho e flores tropicais –, e um quinto trabalho trata do impacto ambiental, com consequências socioeconômicas, da introdução e disseminação do capim-annoni nos pampas gaúchos.
Os autores que analisam a produção de feijão nos dois artigos o fazem em escalas diversas – local e mundial – e sob distintas óticas, ou seja, fortemente agronômica, em Panorama de 20 anos e perspectivas da cultura do feijão no Rio Grande do Sul, e essencialmente econômica no estudo Características nutricionais, produção e comércio mundial de feijões.
Assinado por Alcido Elenor Wander, Rosaura Gazzola, Jussara Gazzola, Tiago Ribeiro Ricardo e Fernando Luís Garagorry, Características nutricionais, produção e comércio mundial de feijões traz dados sobre as vantagens nutritivas e as taxas de consumo da leguminosa – decrescente em 26% entre 2003 e 2009 – na alimentação dos brasileiros, bem como sobre a produção, exportação e importação no contexto do mercado mundial de feijões dos tipos comum (Phaseolus vulgaris) e caupi (Vigna unguiculata). Fundamentados em dados secundários obtidos e analisados, os autores apontam os cinco maiores produtores, que representam mais de 58% da produção mundial – Brasil, Índia, Myanmar, China e Estados Unidos – e os principais países exportadores do produto – China, Myanmar, EUA, Canadá e Argentina –, que juntos são responsáveis por 77,7% do total exportado. Os principais países importadores do produto são Índia, Brasil, EUA, Reino Unido e Japão, com apenas os EUA apresentando tendência de aumento das importações. O Brasil importa feijões, principalmente da China e da Argentina, e começa a exportar feijões para alguns países, como Venezuela, Japão, Portugal, Estados Unidos e Angola.
O segundo trabalho do presente número é assinado por melhoristas do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e tem por título Potencial produtivo e heterose de híbridos de populações F2 de milho no Estado de São Paulo. Nesse estudo, Maria Elisa Ayres Guidetti Zagatto Paterniani, Cristiani Santos Bernini, Paula de Souza Guimarães, Sérgio Doná, Paulo Boller Gallo e Aildson Pereira Duarte avaliam a obtenção de híbridos de populações F2 como alternativa potencialmente viável para a redução do custo das sementes de milho. O trabalho objetivou identificar híbridos promissores quanto aos caracteres agronômicos florescimento masculino, altura de planta, altura de espiga e peso de grãos, bem como estimar a heterose para peso de grãos. Avaliaram-se 56 híbridos de populações F2 oriundos de dialelos completos entre 16 populações F2 parentais, sendo estas provenientes da autofecundação de híbridos comerciais, nos anos agrícolas 2008–2009 e 2009–2010, no Centro Experimental Central do Instituto Agronômico de Campinas (Campinas), na APTA Regional do Nordeste Paulista (Mococa) e na APTA Regional do Vale do Paranapanema (Palmital). Como resultado, foram obtidos 17 híbridos de populações F2 com desempenhos produtivos equivalentes aos das testemunhas comerciais DKB 350, DKB 390 e IAC 8333. Elevados valores de heterose indicam efeitos de dominância na expressão da produtividade em cruzamentos específicos, confirmando o potencial produtivo de híbridos de populações F2 para produção comercial de milho.
Reflexos econômicos, sociais e ambientais da invasão biológica pelo capim-annoni (Eragrostis plana Nees) no bioma Pampa é o ensaio de Nadilson Roberto Ferreira e Eduardo Ernesto Filippi sobre uma das causas de perda de biodiversidade nos Pampas gaúchos. O estudo traça um breve histórico da introdução e disseminação do capim-annoni nos campos do sul do Brasil, na década de 1950, e analisa o processo de descaracterização e perda de biodiversidade do bioma Pampa à luz de três fatores determinantes: a invasão biológica pelo capim-annoni, a expansão da atividade agrícola fortemente representada pela soja e a silvicultura. Os autores concluem que há necessidade e importância do estabelecimento de critérios ambientais e sociais quando do zoneamento das novas atividades, para resguardar a sustentabilidade da pecuária de corte sobre as pastagens nativas, conservando a biodiversidade dos campos e barrando o avanço ilimitado da fronteira agrícola.
O artigo O uso do comércio eletrônico no ramo de flores tropicais em Pernambuco, de Euri Charles Andrade da Silva e Tales Vital, traz os resultados de um estudo sobre comércio eletrônico (e-commerce) realizado no âmbito da cadeia produtiva de flores tropicais em Pernambuco, o estado que ocupa o quinto lugar nacional na produção e comercialização dessas flores. Os autores analisaram quatro empresas do setor que negociam produtos em sites desenvolvidos para atender e fidelizar clientes de diversos lugares do Brasil e do mundo. Três dessas empresas, além da comercialização de flores tropicais, ocupam-se também da sua produção; e apenas uma delas faz exclusivamente revenda. Utilizando-se da metodologia dos dez passos da operação do comércio eletrônico, os autores mostram os benefícios obtidos pelas empresas em seus negócios com a adoção do e-commerce, permitindo o atendimento de consumidores a distância, criando mercados específicos e melhorando a qualidade e a aparência de seus produtos.
O último artigo deste número – Panorama de 20 anos e perspectivas da cultura do feijão no Rio Grande do Sul, assinado por Gilberto Antônio Peripolli Bevilaqua, Irajá Ferreira Antunes, Janete Joanol Mastrantonio e Neander Teixeira Silveira – concentra-se sobre dados relativos a duas décadas da cultura do feijão no Rio Grande do Sul. Embora o feijão com arroz seja a base da alimentação do brasileiro de baixa renda, o consumo per capita desse grão vem apresentando quedas sucessivas nos últimos anos, tanto no País quanto naquele estado. O objetivo do trabalho é apresentar um panorama da cultura nos últimos 20 anos para delinear os desdobramentos que a cultura poderá ter nos próximos anos, bem como discutir aspectos relacionados aos sistemas de produção em que a cultura se faz presente. Verificou-se que o número de cultivares disponibilizadas, assim como a oferta de sementes, pode ser considerado insuficiente; a incorporação de novas regiões e novos sistemas de cultivo conduz ao aumento da produtividade e da renda do produtor e, consequentemente, da disponibilidade do produto; a demanda por novos tipos de feijão quanto à cor do grão, tamanho do grão e composição nutricional deverá aumentar nos próximos anos; e campanhas de incentivo ao consumo de feijão deveriam ser realizadas, ressaltando as virtudes nutracêuticas do grão.
Na seção Resenhas, Selma Lúcia Lira Beltrão comenta o livro Projeto Unaí: pesquisa e desenvolvimento em assentamentos de reforma agrária, uma obra coletiva coordenada pelos pesquisadores Marcelo Nascimento de Oliveira, José Humberto Valadares Xavier, Suênia Cibeli Ramos de Almeida e Eric Scopel, que apresenta os métodos e resultados de um projeto desenvolvido em estreita colaboração com os assentados da reforma agrária do Município de Unaí, em Minas Gerais, localizado a 170 km de Brasília. A iniciativa do projeto reuniu a Embrapa Cerrados, a Universidade de Brasília (UnB) e o Centre de Coopération Internationale en Recherche Agronomique pour le Développement (Cirad), que se associaram a outras equipes e instituições locais para, baseados na premissa de que o desenvolvimento rural só é possível com a participação efetiva dos agricultores, produzir conhecimento no âmbito em que sua aplicação acontece, ou seja, encontrar e aperfeiçoar conjuntamente soluções viáveis para o desenvolvimento do meio no qual esses agricultores estão inseridos.
Ainda na seção Resenhas, o livro de Leandro Narloch – Guia politicamente incorreto da história do Brasil – é comentado por Ivan Sérgio Freire de Sousa. Segundo Freire de Sousa, o livro de Leandro Narloch “ajuda a esclarecer e desmontar armadilhas que são colocadas no caminho dos que buscam ser originais em termos de investigação científica” e “alerta para as facilidades enganosas do clichê na vida acadêmica, tão prezado pelos que carregam preguiça mental congênita ou adquirida...”. Segundo o crítico, a principal preocupação de Leandro Narloch é mostrar o quão limitada é a historiografia politicamente correta, lembrando que uma parte significativa da historiografia brasileira segue esse modelo. Nesse tipo de historiografia, segundo o autor, “os ricos só ganham o papel de vilões – se fazem alguma bondade, é porque foram movidos por interesses. Já os pobres são eternamente ‘do bem’, vítimas da elite e das grandes potências, e só fazem besteira porque são obrigados a isso”.
Maria Amália Gusmão Martins
Editora Ténica
Texto completo:
PDFDOI: http://dx.doi.org/10.35977/0104-1096.cct2010.v27.18547