INTRODUÇÃO

IVAN SÉRGIO FREIRE DE SOUSA

Resumo


Num sentido bem geral, podemos afirmar que no estudo da geração de novas tecnologias existem, pelo menos, duas abordagens principais: uma que é, basicamente, tecnológica e outra que identifica as forças sociais envolvidas naquele processo. Embora os argumentos de ambas as abordagens tenham lugar nos Cadernos de Difusão de Tecnologia, a equipe que criou a revista e que continua com a sua responsabilidade editorial, bem como a maioria de seus colaboradores, situa os seus trabalhos sobre o fenômeno de criação de novas tecnologias dentro do segundo tipo de abordagem. Filiar-se ao primeiro tipo de perspectiva significa concentrar-se, exclusivamente, nos aspectos técnicos das inovações, como se a técnica se explicasse apenas pela técnica.
Diferentemente, a segunda abordagem não reduz o trabalho científico aos seus determinantes sociais. Ela procura ver, nas tecnologias emergentes, uma prática social em marcha, ou, se se quiser, uma história compactada. Em outras palavras, há determinações sociais nos aspectos técnicos das inovações que explicam a sua emergência e que se escondem nas suas formas concretas. Há, assim, nas páginas dos CDT uma hipótese constantemente trabalhada, discutida e examinada, que é a do fundamento social da tecnologia.
Dentro da Embrapa, os estudiosos dessa hipótese encontram-se espalhados nas diferentes unidades de pesquisa que compõem o sistema. Esses estudiosos têm na equipe de pesquisadores do Departamento de Difusão de Tecnologia uma constante reserva de ânimo acadêmico e nos CDT o seu veículo de estudos, debates e intercâmbio de idéias. É, por exemplo, de 1984 a primeira publicação da "Proposta para um programa de pesquisa sobre a geração de tecnologia agropecuária" (Cad. Dif. Tecnol., 1(3):345-381), escrita por Sousa & Singer, e que circulava, em forma mimeografada, desde 1982.
Fora da Embrapa, uma sólida e dinâmica equipe de sociólogos, economistas e cientistas políticos, de diferentes universidades, tem desenvolvido trabalho nessa área. Pelo estreito contato científico com a equipe do DDT-Embrapa, convém mencionar, entre essas equipes de pesquisadores universitários, os da UNICAMP, UnB, USP e UFRJ.
Este número dos Cadernos inicia-se com um incisivo e coerente trabalho de José Graziano da Silva sobre as perspectivas da agricultura alternativa e o seu discurso considerado falacioso. Duas abordagens sobre as inovações tecnológicas são identificadas: a que atribui a destruição da natureza e da própria vida às relações de produção capitalistas e a que propõe a existência de um "capitalismo verde". Com uma acuidade de análise, com a qual o leitor da área já se habituou, e com argumentos bastante fortes, Graziano da Silva conclui que é impraticável falar em tecnologias alternativas na sociedade capitalista. É um trabalho inteligente e perspicaz, que, pela própria solidez da argumentação, suscitará debates seja na própria Revista, seja em salas de aula.
O trabalho seguinte, "A pesquisa agropecuária federal no período compreendido entre a República Velha e o Estado Novo", de Cyro Mascarenhas Rodrigues, é o segundo de uma trilogia sobre a história da pesquisa agropecuária no Brasil. Cyro adiciona e sistematiza dados históricos que o leitor especializado saberá prezar pelo seu valor e tratamento analíticos.
O terceiro artigo desta seção é o de Edmundo Gastal, "Alguns aspectos básicos para um enfoque institucional adequado do processo de transformação tecnológica na agricultura". Nele há, entre outros, um ponto que, certamente, irá receber uma especial atenção do leitor: o de que, no processo de transformação da agricultura, as instituições mais diretamente envolvidas na produção da base técnica, como as de pesquisa agropecuária, precisariam definir, com propriedade, o público ou os públicos para os quais, preferencialmente, trabalham. Há, no artigo, uma forte crítica ao tecnicismo e uma defesa explícita de uma aceitação formal por parte das instituições de pesquisa da dicotomia (produtor empresário, produtor não-empresário) existente, de fato, na realidade objetiva da produção brasileira. É um trabalho que precisa ser lido e discutido.
O último trabalho da seção de artigos é de autoria de Sérgio Dayrell Porto. É um instigante estudo que recebe o título de "Televisão brasileira: economia e imaginário; Globo Rural e Som Brasil: a mesma safra urbana?". O trabalho de Sérgio Porto é uma excelente peça de crítica cultural escrita por um especialista na área.
Na seção Debates são apresentados dois textos. O primeiro é o manifesto dos pesquisadores científicos do Distrito Federal, que compôs o pronunciamento do seu primeiro presidente, o médico Antônio Teixeira, quando da instalação formal da Associação dos Pesquisadores Científicos do Distrito Federal. O conteúdo do pronunciamento transcende os limites científicos do Distrito Federal e é de interesse da comunidade científica de todo o país, daí a sua inclusão nesta seção dos Cadernos.
O segundo texto da seção Debates recebe o título de "Difusão de tecnologia para o setor agropecuário: a experiência brasileira". É o conteúdo de uma palestra proferida no I Seminário de Agricultura e Comunicação (I AGRICOM), realizado em São Paulo em agosto deste ano.
Na seção Resenhas, os livros de S. Schwartzman & C. de M. Castro (Pesquisa universitária em questão) e P. Singer (O dia da lagarta) são comentados, respectivamente, por Marília Madalena Prado Paranhos e Eliacir Marques Pereira.
Esperamos que o leitor aprecie mais este número da Revista.

Palavras-chave





DOI: http://dx.doi.org/10.35977/0104-1096.cct1987.v4.9176