INTRODUÇÃO

Cyro Mascarenhas Rodrigues

Resumo


Antes de apresentar os artigos deste número, lamentamos registrar a perda de um dedicado colaborador dos Cadernos de Ciência & Tecnologia, Sidival Lourenço, do nosso quadro de consultores científicos, ocorrida no dia 26 de maio último. O Sid, como era carinhosamente tratado pelos mais próximos, cumpriu a sua missão terrena depois de revelar-se um abnegado profissional e uma figura humana exemplar. Foi pesquisador na área de Solos, tendo ingressado na Embrapa desde a sua fundação, tornando-se ali figura muito destacada, conhecedor profundo da Empresa e defensor intransigente da sua estabilidade. Mesmo com tempo suficiente para a aposentadoria, Sidival permaneceu na ativa até seu último dia de vida, aos 66 anos, como secretário executivo da Comissão Técnica do Subprograma Café, no Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento. Ao companheiro Sid o nosso reconhecimento e a nossa saudade.

Informamos também que o Conselho Editorial dos CC&T realizou, em maio, a sua primeira reunião do ano. Além de medidas operacionais com vistas à dinamização e à ampliação da circulação da revista, ficou decidida a edição de alguns números temáticos, enfocando questões atuais do agronegócio brasileiro. Agricultura de precisão, barreiras não-convencionais no comércio internacional, sanidade animal, agricultura orgânica e a questão dos transgênicos são apenas alguns dos temas selecionados. Não menos importante é a questão da segurança alimentar, assunto obrigatório nas agendas de fóruns nacionais e internacionais que têm debatido os problemas do Terceiro Milênio. De fato, são assustadoras as estatísticas que apontam a existência de cerca de um bilhão de seres humanos vivendo em situação de miséria absoluta. A cada 3,6 segundos registra-se uma morte causada pela fome em algum lugar do planeta, sendo 75% de crianças abaixo de cinco anos. Seria ingênuo creditar simplesmente à escassez de oferta de alimentos a existência desse flagelo que envergonha a humanidade, esquecendo-se das relações sociais e internacionais perversas quase sempre indutoras de políticas econômicas excludentes que reduzem ou anulam o poder de consumo dos mais pobres, notadamente do Hemisfério Sul. Mas nem por isso se pode negar a importância do desenvolvimento científico e tecnológico na busca de soluções para esse problema, sobretudo em países mais pobres desse hemisfério que têm na biodiversidade dos seus ecossistemas um trunfo valioso para assegurar o desenvolvimento sustentável. Pelo menos é o que nos mostram os dois primeiros artigos dessa edição.

Começamos com o artigo assinado por Eduardo Alberto Vilela-Morales e Afonso Celso Candeira Valois: "Recursos genéticos vegetais autóctones e seus usos no desenvolvimento sustentável". Os autores partem do pressuposto de que o Brasil, país mais rico em diversidade biológica de plantas, animais e microrganismos, ostentando 20% de toda a biodiversidade do planeta, precisa incrementar o uso dos recursos genéticos vegetais autóctones, como forma de reduzir a dependência de espécies exóticas com vistas ao desenvolvimento sustentável da agricultura. As estruturas genéticas, no seu modo de ver, podem melhorar a produtividade e a qualidade dos produtos, constituindo-se num grupo de insumos estratégicos e de baixo custo, considerando-se que já estão disponíveis na natureza. Recomendam, finalmente, ações sistêmicas interinstitucionais com vistas a integrar três componentes básicos: estudos científicos fundamentais, estudos científicos tecnológicos e estudos socioeconômicos para dar suporte a programas de desenvolvimento, com a participação de organizações de desenvolvimento regional e de segmentos do setor produtivo.

Segue-se "A moderna biotecnologia e o desenvolvimento da Amazônia", um artigo de Francisco Barbosa que enfoca exatamente o encaminhamento de questões levantadas no artigo anterior sob a ótica do desenvolvimento regional. Ele introduz a discussão com uma constatação interessante sobre o confronto que hoje se verifica entre os esforços empresariais para cercar e comercializar os recursos genéticos, e a crescente resistência de países e ONGs que lutam para obter uma parcela mais significativa dos frutos da revolução biotecnológica.

O confronto se dá em razão de os recursos tecnológicos, laboratoriais e financeiros imprescindíveis para alimentar essa revolução biotecnológica encontrarem-se no Hemisfério Norte, enquanto a maior parte dos recursos genéticos essenciais para viabilizá-la concentram-se nos ecossistemas tropicais do Hemisfério Sul. Prevendo que uma das principais batalhas econômicas e políticas do próximo século será travada pelo controle dos recursos genéticos do planeta, Francisco Barbosa conclui apresentando os traços gerais de uma nova proposta de desenvolvimento da Amazônia fundada nas inovações biotecnológicas, na engenharia genética e nos seus desdobramentos.

A questão do meio ambiente é aqui tratada, também, sob outro enfoque: o da valoração econômica. No artigo intitulado "Valoração econômica do meio ambiente: ciência ou empiricismo?", Jorge Madeira Nogueira, Marcelino Antonio Asano de Medeiros e Flávia Silva Tavares de Arruda nos brindam com uma boa revisão crítica de conhecimentos sobre os métodos disponibilizados pela teoria neoclássica, nessa área. Segundo os autores, esses métodos revelam-se instrumento valioso para auxiliar os responsáveis pelas decisões de políticas públicas, bem como para orientar a seleção criteriosa de projetos com maiores possibilidades de ganho de bem-estar social. A estimativa de perdas decorrentes da "pirataria genética" é citada, também, como exemplo da importância estratégica de utilização dos métodos de valoração econômica do meio ambiente.

O artigo seguinte, "A SBPC e a pesquisa científica sobre agricultura e meio ambiente", de Antonio Teixeira de Barros, relata os resultados de uma análise de conteúdo dos periódicos Ciência & Cultura e Ciência Hoje, no período compreendido entre a Eco 72 e a Eco 92. Foram examinados mais especificamente o enfoque dos artigos, a temática enfatizada e as áreas de conhecimento que mais se destacaram na produção científica.

Fechando a seção de Artigos, Ivo Martins Cezar, Sarah Skerratt e J. Barry Dent, retomam uma questão sempre em pauta na agenda dos administradores de pesquisa: a transferência de tecnologia. Em "Sistema participativo de geração e transferência de tecnologia para pecuaristas: o caso aplicado à Embrapa Gado de Corte", eles apresentam uma proposta que consideram inovativa, na medida em que prescreve ações participativas para a detecção de demandas e geração de soluções, opera o fluxo de informações com base em redes de informações preexistentes e monitora o feedback de pesquisa.

Na seção Debates, Volnei Garrafa apresenta as idéias que fundamentaram a sua participação no "Seminário sobre Aspectos Éticos das Pesquisas em Biotecnologia", a convite da Embrapa - Recursos Genéticos e Biotecnologia, promotora do evento realizado no dia 10 de abril deste ano, no Cenargen. Como o objetivo desta seção é estabelecer o contraditório, pedimos aos interessados em debater essas idéias que nos enviem as suas contribuições com a maior brevidade, a tempo de saírem no próximo número, com a réplica do autor.

Na seção Resenhas, Gutemberg Armando Diniz Guerra nos mostra como o Núcleo de Altos Estudos da Amazônicos, da Universidade Federal do Pará, tem contribuído para a compreensão do fenômeno da violência no campo, a partir do comentários sobre três livros originados de teses de pós-graduação defendidas naquela Universidade, tendo como autoras: Marcionila Fernandes, Luciana Miranda Costa e Marília Ferreira Emmi.

Para concluir, pedimos aos nossos leitores que se manifestem quanto à orientação editorial e conteúdo dos Cadernos de Ciência & Tecnologia, para que possamos melhorar sempre. No aguardo dessa manifestação, solicitamos, também, que se a revista estiver agradando recomendem-na a colegas, alunos, amigos e pessoas interessadas na temática. Disso depende a nossa sobrevivência.


Palavras-chave





DOI: http://dx.doi.org/10.35977/0104-1096.cct2000.v17.8867