INTRODUÇÃO

Cyro Mascarenhas Rodrigues

Resumo


Com este número, os Cadernos de Ciência & Tecnologia entram no seu vigésimo ano, seguindo uma trajetória de muita luta para prosseguir debatendo e refletindo criticamente sobre questões de interesse da C&T relacionadas, principalmente, ao agronegócio e ao desenvolvimento rural. Nesta atmosfera de otimismo e esperança que tem contagiado a sociedade brasileira, ficamos na expectativa de que o novo governo concretize a sua plataforma de campanha, principalmente no que tange a C&T, cujas diretrizes, reunidas no documento "Carta à SBPC", foram apresentadas e discutidas pelo então candidato Luiz Inácio Lula da Silva, na última reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, realizada em julho de 2002, em Goiânia.

Abrimos esta edição com o artigo Pluriatividade e desenvolvimento rural no Sul do Brasil, assinado por Flávio Sacco dos Anjos. Essa temática que tem sido discutida nos meios acadêmicos e em muitas organizações de P&D, certamente dará rumo aos programas de desenvolvimento rural do novo governo. O autor sustenta que o fenômeno da pluriatividade, surgido de modo espontâneo para ajustar a família rural a uma nova situação, pode muito bem ser incorporado às estratégias de políticas públicas de corte territorial e não apenas setorial.

Os novos assentamentos rurais, por exemplo, poderiam transformar-se em espaços de produção onde a exploração racional e sustentável dos recursos naturais conviveria com a diversificação das atividades nos moldes da pluriatividade.

O foco deste artigo está centrado na Região Sul, mas oferece uma contribuição ao debate nacional sobre as alternativas para a agricultura familiar.

O próximo artigo, Indústria de tabaco, tabagismo e meio ambiente, de Sérgio Luís Boeira e Julia Guivant, aborda uma temática pouco explorada por pesquisadores brasileiros. Além de instigante, dada a forte controvérsia suscitada pelo seu conteúdo, o trabalho inova ao propor uma estratégia conceitual para a análise de articulação e oposição de interesses. Dois conceitos básicos - rede estratégica e rede fragmentária - são utilizados para compreender e explicar o intricado jogo que envolve interesses do agronegócio tabagista e de grupos sociais. É interessante também o caráter interdisciplinar dessa abordagem, em que se incluem variáveis ecológicas, biomédicas, sociopolíticas, culturais e econômicas.

Renato Linhares de Assis em Globalização, desenvolvimento sustentável e ação local: o caso da agricultura orgânica retoma uma discussão que, embora já tenha sido objeto de número temático dos Cadernos de Ciência & Tecnologia (v.19, n.2, 2002), acrescenta um ingrediente que merece ser levado em conta: a globalização, que a despeito dos efeitos perniciosos desenvolveu novas sensibilidades culturais sobre a qualidade do consumo, abrindo perspectivas para a agricultura familiar que pode atender a esse tipo de demanda. Entretanto, o resgate do poder regulador do Estado é colocado como uma preliminar para viabilizar políticas de desenvolvimento sustentável local, tendo como vetor sistemas agroecológicos de produção.

Em seguida apresentamos Sistemas agrários: uma revisão conceitual e de métodos de identificação como estratégias para o delineamento de políticas públicas, de Victor Hugo da Fonseca Porto. Com essa revisão, o autor pretende facilitar o trabalho dos interessados nessa temática, ordenando e definindo uma multiplicidade de conceitos e instrumentos de análise encontrados nas literaturas nacional e internacional. Reforça a necessidade de especificar a natureza do tecido social e econômico dos municípios, ao se formular políticas de desenvolvimento regional, e procura desfazer a confusão conceitual muito recorrente na literatura, entre caracterização e identificação/tipificação de sistemas.

De Ignácio Aranciaga, temos o artigo Mapa pesquero austral: hacia una demanda de Ciencia y Tecnologia en el desarrollo del sector. Trata-se de um estudo sobre as mudanças estruturais ocorridas na economia e no Estado Argentino e seus impactos sobre o desenvolvimento do País, na década de 90, principalmente na região pesqueira da Patagônia Austral. O autor ressalta a necessidade de novos padrões de articulação entre o Estado, o setor produtivo e o setor científico-tecnológico para tornar viáveis as políticas que redundem em benefícios para o desenvolvimento local e regional.

O próximo artigo, Tomates: produção e comercialização no município de Chapecó, SC, de Evelise Espírito Santo e Fernanda Micheli D'Agostini, resulta de uma pesquisa realizada com o objetivo de estudar a cadeia produtiva e as margens de comercialização do produto naquele município. Como o próprio título indica, o alcance desse estudo de caso é muito limitado, mas os seus achados e recomendações revestem-se de importância para orientar o desenvolvimento da produção local.

Na seção Resenhas, Maria Amália Gusmão Martins comenta Ciência, Tecnologia e Sociedade: o desafio da interação, uma obra editada pelo Instituto Agronômico do Paraná.

Excepcionalmente, não apresentaremos texto para a seção Debates, em razão de não termos recebido nenhuma contribuição adequada até o fechamento de nossa edição. Esperamos que no próximo número possamos retornar com essa seção tradicional dos Cadernos de Ciência & Tecnologia.

Por último, um registro importante. Com esta edição, nos despedimos da editoria dos Cadernos de Ciência & Tecnologia. A partir do próximo número a colega Maria Amália Gusmão Martins assumirá a função de editora técnica a quem desejamos muito sucesso em sua nova missão.

Na oportunidade, agradecemos a dedicada colaboração de todos os companheiros que estiveram conosco nessa jornada, responsáveis diretos e indiretos pela qualidade de forma e conteúdo da nossa revista. Referimo-nos ao nosso Conselho Editorial, agora presidido por Gustavo Chianca, Diretor-Executivo da Embrapa, aos consultores científicos e aos autores de artigos, resenhas e textos para debate, sem esquecer dos companheiros responsáveis pelo tratamento editorial, composição, arte e impressão gráfica.

A eles e aos nossos leitores, o nosso reconhecimento e a certeza de que continuaremos em sintonia com os nossos Cadernos.




DOI: http://dx.doi.org/10.35977/0104-1096.cct2003.v20.8732